Opinião

50 anos do Dia Mundial do Meio Ambiente

*Bernardo Egas

Na data de hoje, na qual celebramos também os 50 anos da Conferência de Estocolmo, considero urgente dar luz ao papel das cidades no enfrentamento das mudanças climáticas e a importância da gestão integrada dos resíduos sólidos.

O dia 05 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), foi estabelecido na histórica Conferência de Estocolmo, em 1972, com o objetivo de conscientizar a população para a importância da preservação dos recursos naturais, que ainda eram considerados, por muitos, infinitos e, portanto, inesgotáveis.

Nesta data de hoje, na qual celebramos também os 50 anos da Conferência de Estocolmo, considero urgente dar luz ao papel das cidades no enfrentamento das mudanças climáticas em curso e a importância da gestão integrada dos resíduos sólidos.

Como o caminho no qual os municípios devem perseguir para efetivamente contribuir com soluções concretas em alinhamento com os objetivos do Acordo de Paris de 2015, ou seja, manter a elevação da temperatura global bem abaixo de 2 graus Centígrados e buscar esforços limitar o aumento da temperatura global em 1,5 ºC.

Após 12 anos da Lei nº 12.305/10 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, estados, municípios e geradores ainda estão longe da implementação da gestão integrada e gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU).

No último dia 23 de maio, uma reportagem do Jornal Nacional trouxe dados alarmantes: segundo o Diagnóstico de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos do Brasil, mais de 82 milhões de toneladas de lixo são produzidos no país, por ano, e apenas pouco mais de 2% é reciclado.

Apesar de toda a legislação existente para impedir a poluição causada pelos resíduos sólidos, a sua destinação inadequada para lixões a céu aberto e aterros controlados, e não para os aterros sanitários, é cerca de 40% do total de resíduos coletados, ou seja, cerca de 30,3 milhões de toneladas por ano.

Para se ter uma ideia, essa quantidade é capaz de encher 765 estádios do Maracanã, tendo impacto direto no meio ambiente e na saúde de 77,5 milhões de pessoas. No Brasil, cerca de 3 mil municípios ainda descartam os resíduos urbanos em lixões e aterros irregulares1.

O mais recente estudo do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil mostra que a fração orgânica dos resíduos sólidos é a principal componente dos RSU, representando 45,3% do total, ou seja, são gerados cerca de 37 milhões de toneladas por ano.

Já os materiais recicláveis secos representam 35% de todo o resíduo gerado, ou seja, cerca de 27,8 milhões de toneladas por ano. Destes, o plástico representa 16,8%, papel e papelão 10,4%, resíduos têxteis, couros e borrachas 5,6%, vidros 2,7%, metais 2,3% e embalagens multicamadas 1,4%. Os rejeitos representam ainda 14,1% do total.

Publicado no último dia 14 de abril no Diário Oficial, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), instituído pelo Decreto Federal Nº 11.043, de 13 de abril de 2022, tem como meta reciclar 14% de todo o lixo produzido no país até 2024, chegar aos 50% em 2040 e, ainda, reforça a importância do encerramento de lixões e aterros clandestinos do país até 2024.

É importante destacar que o Plano não trata apenas da reciclagem, oferecendo uma visão integrada, considerando também metas de compostagem e biodigestão.

Pode-se atribuir à falta de recursos aplicados no setor para o custeio dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, na maioria dos municípios brasileiros, como a principal causa da falta de resultados significativos.

No entanto, o Novo Marco Legal do Saneamento, Lei nº 14.026/2020, que alterou a Lei Federal nº 11.445/2007, determina que a sustentabilidade econômico-financeira dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos deve ser assegurada, ou seja, o Novo Marco Legal do Saneamento obriga a que haja cobrança pelos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos.

Sob a nova legislação, o seu não cumprimento pode caracterizar renúncia de receita, no âmbito da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Estados, municípios e geradores devem enxergar a gestão integrada de resíduos sólidos urbanos para além de reciclagem, por meio de uma abordagem mais holística, considerando também ações de redução da geração de resíduos e a valoração – por meio compostagem e biodigestão – como importantes aliados para a proteção da saúde pública, preservação do meio ambiente, mitigação das mudanças climáticas e desenvolvimento econômico e social.

Em 2020, o manejo de resíduos sólidos urbanos em todo o país foi responsável por 291,6 mil empregos diretos e 15,4 mil empregos temporários. Estimativas para 2021 indicam que o setor tenha empregado diretamente 358 mil pessoas.2

No Rio de Janeiro, a Câmara Municipal de Vereadores, liderada pelo Presidente Carlo Caiado, recebeu o Prêmio Lixo Zero 2021, que reconhece os melhores projetos brasileiros que promovem atitudes sustentáveis em prol do planeta. A casa legislativa carioca, o Palácio Pedro Ernesto, se tornou o primeiro prédio público do Brasil a adotar o conceito Lixo Zero, dando um senso de responsabilidade, propósito e cuidado com as futuras gerações.

Oito meses após iniciar o projeto de destinação adequada dos resíduos, estabelecido na Carta Compromisso Lixo Zero, a Câmara Municipal do Rio atingiu um excelente índice de boas práticas, com 91,5% de seus resíduos destinados à compostagem ou reciclagem, deixando de enviá-los a aterros sanitários.

Além disso, a Semana Lixo Zero foi incluída no Calendário Oficial da Cidade, através da Lei nº 6.905 de 24 de maio de 2021, o que demonstra o compromisso do legislativo municipal com esta pauta.

A Companhia Municipal de Limpeza Urbana – Comlurb da Cidade do Rio de Janeiro possui uma unidade de biometanização, que transforma cerca de 35 a 50 toneladas por dia de matéria orgânica dos resíduos sólidos urbanos (RSU) em biogás, utilizado para a geração de energia e de biocombustível.

Localizada no Ecoparque do Caju, a unidade de biometanização de resíduos é a primeira da América Latina. Segundo dados da Comlurb, a energia gerada a partir da combustão do biogás atende à demanda da própria planta, além de ser suficiente para abastecer a Unidade de Transferência de Resíduos do Caju (UTR).

O excedente poderia ainda abastecer mais de 1.000 residências, considerando consumo médio da família brasileira, de cerca de 160 kWh/mês, além da frota elétrica da Comlurb, atualmente composta de dez veículos e, ainda, tem potencial para abater a conta de luz da sede da Comlurb e das gerências com o mesmo CNPJ, num conceito chamado de geração distribuída.3

Na ótica da valoração de resíduos, a COMLURB também possui iniciativas voltadas, principalmente, à compostagem. Um acordo firmado em 2016 entre a Prefeitura do Rio de Janeiro e a Prefeitura da Cidade de Colônia, na Alemanha, no âmbito do projeto Parcerias Municipais para o Clima, garantiu a doação pela cidade alemã de um equipamento de última geração para fragmentação e peneiramento dos resíduos de poda, que atualmente processa mais de 600 toneladas por mês, frutos das atividades de poda de árvores da cidade.

O produto deste tratamento está sendo usado como combustível de fornos de cerâmica e como substrato para compostagem. O composto posto produzido pela Comlurb é utilizado nos projetos de agricultura urbana e reflorestamento da cidade – Hortas Cariocas e Refloresta Rio, respectivamente.

Cabe destacar que são produzidos diariamente cerca de 10 mil toneladas de resíduos sólidos. A fração orgânica responde por quase 50% do total4.

Segundo dados do Monitoramento de Emissões de Gases de Efeito Estufa da Cidade do Rio de Janeiro5, executado pelo Instituto Pereira Passos e pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Cidade, o gás metano foi responsável, em média, por mais de 16% das emissões da cidade ao longo de todo o período, ou seja, de 2012 a 2019.

Segundo o estudo, a disposição em aterro é a principal destinação para os resíduos sólidos gerados no município e também a principal fonte emissora do setor, responsável por mais de 14% das emissões totais da Cidade em 2019.

Portanto, a gestão integrada de resíduos sólidos e ações de redução da geração de resíduos são importantes aliados da pauta climática dos governos locais, na medida em que tais medidas permitem evitar um dos maiores vilões do aquecimento global: o gás metano, que é capaz de reter calor na atmosfera vinte e oito vezes mais do que o dióxido de carbono.

No Brasil, o Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB) tem uma missão ainda mais desafiadora: disseminar o conceito Lixo Zero, que consiste no máximo aproveitamento e correto encaminhamento dos resíduos recicláveis e orgânicos e a redução ou extinção do encaminhamento destes materiais para os aterros sanitários eou para a incineração.

O seu principal objetivo é disseminar esse conceito Lixo Zero e articular programas de conscientização ambiental, destacando a importância da certificação, reestruturação e controle sobre os resíduos produzidos pela sociedade. O ILZB tem mais de 2.000 embaixadores, nas 5 regiões do país, espalhados pelos 26 Estados e o Distrito Federal.

Este movimento vem crescendo cada vez mais e tem se consolidado como um importante instrumento de gestão integrada de resíduos sólidos urbanos. No contexto regional da América Latina, foi recentemente criado o Basura Cero Latam – Lixo Zero América Latina – que integrará os países da região para contribuir com soluções integradas para o setor de resíduos.

Fortalecer a coleta seletiva e toda a cadeia da reciclagem, fomentar ações de redução da geração de resíduos sólidos e escalar projetos de valoração de resíduos, são fundamentais para proteger a saúde pública, preservar o meio ambiente, mitigar as mudanças climáticas, garantir a justiça climática, além de garantir o desenvolvimento econômico e social, principalmente, das populações e comunidades mais vulneráveis das nossas cidades.

*Bernardo Egas é formado em Direito pela PUC e pós-graduado em Liderança e Gestão Pública pelo Centro de Liderança Pública de São Paulo. Na Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, foi subsecretário de Administração, Presidente do PREVI-RIO, Presidente da FOMENTA RIO e Secretário de Meio Ambiente. Atualmente trabalha na Câmara Municipal, como Coordenador de Sustentabilidade.

Fonte: Eco Debate