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Opinião

Florestas voltam a virar carvão em Minas: ferro gusa sujo!

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*Maria Dalce Ricas

Em Minas, a boiada do desmatamento continua passando em silêncio. Durante mais de meio século, a siderurgia no Estado foi alimentada por carvão feito da Mata Atlântica e do Cerrado. Nos fornos “rabo quente”, trabalhavam crianças e adultos em condições iguais à de escravos.

Milhões de árvores foram jogadas ao chão e milhões de animais viraram carvão. Milhões de dólares foram embolsados pelas empresas e os impactos sobre a água, solo, clima, paisagens e biodiversidade ficaram para a sociedade, caracterizando a conhecida sentença: “privatizar lucros e socializar prejuízos”. De “quebra” as empresas, principalmente de ferro gusa, poluíam o ar, água e solo em suas plantas industriais.

Lutar contra isto foi bandeira da Amda durante décadas, enfrentando ameaças e a clara cumplicidade do poder público e de órgãos patronais como Fiemg e Sindifer. Sugestões óbvias como não separar a licença das plantas industriais e do plantio de florestas foram ignoradas ou rechaçadas pela Semad.

Finalmente em 2013, conseguimos que o consumo de carvão de florestas nativas (não só de Minas) fosse proibido no Estado a partir de 2018, através da Lei N.º20.922.

O país atravessava uma crise econômica e a reação foi pouca. Grande parte das empresas de ferro gusa, principalmente as chamadas “vagalumes” ( fechavam quando o mercado estava ruim e reabriam quando estava bom), que consumiam carvão de mata nativa, estavam paralisadas.

A proibição foi apoiada por empresas autônomas na produção de carvão de florestas plantadas, que sofriam concorrência desleal das “vagalumes”. Plantar floresta, de forma ambientalmente correta exige altos investimentos e responsabilidade sócio/ambiental. Mas a Mata Atlântica e o Cerrado foram feitos pela natureza a “custo zero”.

Porém, em 2017 a demanda por ferro gusa voltou a crescer e a tragédia recomeçou: desmatamento, mão-de-obra infantil, concorrência desleal. O carvão é transportado à noite e entra livremente nos pátios das empresas. A fiscalização da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e da Polícia Ambiental é pontual e insuficiente. E vem sido desmontada nos últimos anos.

O gusa é o primeiro passo industrial para produção do aço, fundamental a qualquer produto ou serviço utilizados pelas sociedades humanas. Mas sua fabricação pode e deve ser sustentável, porque a água, solo, biodiversidade e clima são ainda mais imprescindíveis à vida.

*Maria Dalce Ricas

Superintendente Executiva da Amda