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Ciclo de Vida

Ciclo de Vida do Cimento

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Ciclo de Vida do Cimento

CICLO DE VIDA

1. Extração do calcário

O ciclo de vida do cimento, e também seus impactos ambientais, inicia-se com a mineração da rocha calcária, que é realizada em grandes lavras mecanizadas a céu aberto. Desmontadas com explosivos, elas são transportadas, geralmente por caminhões, até a instalação de britagem, onde as pedras são reduzidas a dimensões adequadas ao processamento industrial.

Como outras minerações, o desmonte das rochas para obtenção do calcário altera o relevo terrestre. Os maciços calcários formam um dos mais interessantes e importantes ecossistemas no planeta. Em grande parte, durante milhões de anos, a água, infiltrando-se na rocha, formou magníficas cavidades subterrâneas e, dentro delas, esculpiu dezenas de formações, como estalactites, estalagmites e até verdadeiros “jardins” de pedra.

Além disso, como na região cárstica (1) de Lagoa Santa, é bastante comum que esses maciços sejam associados à presença de complexos hídricos subterrâneos e superficiais, formados por rios, lagos e sumidouros.

Nas lapas e cavernas calcárias está registrada grande parte da história humana sobre o planeta, pois elas serviam de abrigo aos nossos ancestrais, que registraram sua presença com pinturas rupestres (pinturas em pedras), restos de fogueira, ossadas humanas e animais.

Lagoa Santa é considerada o berço da ecologia mundial, pois foi em seu complexo de grutas que o pesquisador norueguês Peter Lund descobriu, há mais de cem anos, os primeiros testemunhos da presença humana nas Américas. Depois dele, centenas de pesquisadores fizeram e continuam a fazer novas descobertas, como o gigantesco fóssil da preguiça gigante e um crânio humano %u2013 batizado de Luzia, pertencente a uma mulher que ali viveu há cerca de 11.500 anos %u2013, restos de cerâmica, urnas funerárias e outros materiais.

Minas Gerais é um dos estados brasileiros mais ricos em maciços calcários, que estão sempre associados à presença de Mata Seca no topo e paredões (ecossistema cujas árvores perdem as folhas na época de seca) e matas estacionais semideciduais (perdem parcialmente as folhas) nas bases dos maciços. Essa associação de água, abrigos e vegetação, permite que as áreas calcárias sejam muito ricas em fauna.

A produção de cimento mostra-se, até hoje, indispensável à nossa forma de vida, mas traz consigo impactos ambientais graves, cuja minimização deve ser feita através da proteção máxima possível das cavidades subterrâneas e de seus patrimônios espeleológicos (2), arqueológicos (3), paleontológicos (4), da água, fauna e flora.

2. Transporte

O carregamento tanto de caminhões quanto de correias transportadoras da rocha calcária até as instalações de britagem demanda uso de combustíveis fósseis (óleo diesel, gasolina, graxas etc). E esse gasto continua quando os caminhões deslocam-se até as mesmas. É bom lembrar também que no processo de fabricação de todos os equipamentos utilizados (tratores, pás carregadeiras, caminhões) houve consumo de matérias primas diversas extraídas da natureza (petróleo, plásticos, minério de ferro/aço, energia etc), e geração de impactos.

A queima de combustíveis fósseis libera gases de carbono, causadores do Efeito Estufa e alterações climáticas. Assim como a mineração da rocha em si, não há como evitar esse impacto, que ele deve ser minimizado ao máximo através da economia de combustível, uso de biocombustíveis, regulagem de motores e neutralização de emissões (5).

3. Processo industrial

Há dois métodos para fabricação de cimento: o processo seco e o úmido. Este último já quase não é utilizado, por gastar muito mais água e energia. Para se ter uma idéia, mesmo a produção de cimento sendo 99% pela via seca hoje no Brasil – que gasta três vezes menos energia que a úmida – ainda assim é a 7ª atividade industrial que mais consome energia.

Em um depósito, calcário e argila são estocados separadamente. No compartimento dos materiais, um equipamento se encarrega de misturá-los, para formar um único composto.

No processo úmido, a mistura é moída com adição de aproximadamente 40% de água e entra no forno rotativo sob forma de pasta de lama. No processo seco, a mistura é moída totalmente seca.

O composto resultante (90% calcário e 10% argila), é dosado para ser moído a fim de se obter uma “mistura crua” de produto. O processo de moagem é feito em um moinho cheio de bolas ou rolos de impacto. O moinho também fica estrategicamente colocado contra uma corrente de gás quente, que realiza a secagem do material.

Depois de moído, o produto é estocado em compartimentos – chamados silos – onde é feita a homogeneização. Após essa etapa, é introduzido no forno, passando antes por pré-aquecedores (denominados pré-calcinadores), que são equipamentos que aproveitam o calor dos gases provenientes do forno e promovem o aquecimento inicial do material.

A próxima etapa é a de clinquerização, onde, em um forno que funciona à base de óleo pesado, petróleo (coque), carvão mineral ou vegetal, ocorrem reações físicas e químicas durante o cozimento. Ao sair dali, o material formado – denominado clínquer, com aspecto de bolotas escuras – possui temperatura da ordem de 1200°C a 1300°C. Passa, então, por processo de resfriamento, (passagem de corrente de ar frio no clínquer), para que esta fique entre 70°C e 90°C.

As emissões atmosféricas do resfriador (vapor e material particulado) são captadas e direcionadas para filtros. Um trocador de calor reduz a temperatura dos gases antes desses passarem pela filtragem.

O uso intenso de combustíveis, tais como coque e moinha de carvão vegetal e/ou mineral nos fornos das fábricas de cimento, libera grande quantidade de gases e poeiras para a atmosfera. Para cada tonelada de clínquer produzido, mais de 600 kg de CO2 são gerados. Vale lembrar que os impactos ambientais da produção de carvão mineral são grandes, não só pelas emissões atmosféricas, mas como também pelos riscos inerentes à mineração. No caso do carvão vegetal, a exploração madeireira, com grande volume de madeira retirada de matas nativas, constitui o principal impacto ambiental.

O coprocessamento, que consiste na queima de materiais contaminados (excetuando-se resíduos hospitalares), como pneus, emborrachados, resinas, colas, látex, e outros nos fornos de cimento, é considerada alternativa para também gerar energia e diminuir uso de coque e carvão, e também solução para destinação final desses resíduos. Mas o coprocessamento é licenciado (6) de forma separada da fabricação de cimento, devido à necessidade de equipamentos capazes de impedir emissão de gases tóxicos decorrentes da queima desses materiais.

Após o resfriamento, o clínquer é transportado e estocado em um galpão fechado, onde é moído com outros materiais aditivos (gesso, calcário, escória de alto-forno (7) e pozolanas (8)), produzindo o cimento segundo as normas de definição e regulamentação do produto.

O cimento é então transportado para silos de estocagem, onde é acondicionado em sacos de papel do tipo KRAFT III, de 25 ou 50 kg. O transporte do mesmo para atacadistas e varejo, geralmente feito em caminhões, adiciona outra etapa de impactos ambientais já mencionados.

4. Uso do cimento

Conforme já mencionado, o cimento é produto essencial à nossa forma de vida, por sua utilização em todas as fases da construção de casas, edifícios, muros, rodovias etc. Seus “restos” constituem-se em parcela predominante da massa total dos resíduos sólidos urbanos produzidos nas cidades. A fragilidade de controle por parte do poder público, baixa conscientização e também irresponsabilidade de usuários – pessoas físicas e jurídicas – resulta em depósitos clandestinos dos mesmos, que podem provocar assoreamento de cursos d’água, obstruir córregos e drenagens (galerias, sarjetas etc), colaborando com enchentes e favorecendo proliferação de mosquitos e outros causadores de doenças.

5. Reciclagem

A utilização de resíduos de cimento como matéria-prima reduz a quantidade de recursos naturais retirados do meio ambiente e, consequentemente, os impactos que decorrem de sua fabricação.

É possível reciclar qualquer concreto, desde que seja escolhido o uso adequado e se respeitem as limitações técnicas. Entulho de construção reciclado pode substituir em grande parte agregados naturais empregados na produção de concreto. Apenas concretos com substâncias contaminantes, como sulfato de cálcio, cloretos e óleos podem trazer prejuízo às propriedades do concreto no estado fresco e endurecido, e não devem ser utilizados como matéria-prima.

Os sacos de cimento também devem ser encaminhados à reciclagem. Vale sempre lembrar que esta resolve o problema da grande geração de resíduos, porém, seu processo também gera impactos ao meio ambiente, como, por exemplo, liberação de emissões atmosféricas.

6. Considerações finais

Sendo o cimento produto indispensável à nossa vida, a obrigação de seus fabricantes é buscar produzi-lo da forma menos impactante possível. Obter licença através de estudos ambientais é o primeiro passo para isto.

Cabe ao poder público zelar pelo cumprimento das leis e das normas técnicas que minimizam os impactos. E cabe aos consumidores finais, cidadãos, empresas da construção civil e ao poder público, utilizar essa matéria-prima da melhor forma possível, tendo como princípios reduzir consumo e reciclar o que for possível.

Vale lembrar também que, além de todos os impactos mencionados, calcário é recurso natural finito e, pelo menos até o momento, é necessário também às gerações que nos sucederão.

7. Resumo do ciclo de vida do cimento e seus impactos

1. Extração do calcário – alteração do relevo, possíveis erosões, perda de patrimônio arqueológico e espeleológico, danos à flora, fauna e recursos hídricos, gasto de combustíveis fósseis, produção de resíduos, emissão de gases causadores do Efeito Estufa.

2. Industrialização – gasto de recursos naturais diversos e de quantidade exorbitante de energia elétrica, geração de efluentes líquidos e gasosos e geração de resíduos sólidos, gasto de combustíveis fósseis e alta emissão de gases causadores do Efeito Estufa.

3. Embalagem e transporte – gasto indireto (fabricação de veículos) e direto de recursos naturais (queima de combustíveis fósseis – gasolina, óleo diesel, graxas), emissão de gases causadores de Efeito Estufa, geração de resíduos sólidos.

4. Consumo – geração de resíduos (embalagens feitas de papel que são recicláveis e entulhos restantes de obras ou demolições também recicláveis).

Figura: Representação esquemática do ciclo de vida do cimento. Fotos obtidas em:

http://esmc2010fq.blogspot.com/2010/05/outao-da-arrabida-i.html

http://www.riosvivos.org.br

http://mineracionempesquisa.blogspot.com/2010/05/extracao-de-carvao-mineral-e-suas.html

http://www.panoramio.com/

http://www.calcariobotuvera.com.br/a-empresa/

http://lajespontual.com.br/site/index.php?idcanal=13

Acessos em 14 de julho de 2011.

Arte: Ducimeire Clara Eurípedes / Projeto Ciclo de Vida – Amda

Glossário

1 – Cárstico: Relevo caracterizado pela ocorrência de dolinas, cavernas e drenagens subterrâneas, desenvolvido em regiões calcárias devido ao trabalho de dissolução pelas águas subterrâneas e superficiais.

2 – Espeleológicos: referente às cavidades. Espeleologia é o estudo de cavidades, grutas, cavernas etc, incluindo seus aspectos físicos e biológicos.

3 – Arqueológicos: referente à arqueologia. Esta é definida como a ciência que estuda o passado humano a partir dos vestígios e restos materiais deixados pelos povos que habitaram a Terra.

4 – Paleontológicos: referente à paleontologia. Esta é a ciência que estuda evidências da vida pré-histórica preservadas nas rochas, elucidando não apenas o significado evolutivo e temporal, mas também a aplicação na busca de bens minerais e energéticos.

5 – A neutralização consiste em elaborar inventário das emissões e neutralizá-las através do plantio de árvores nativas ou projetos de geração de energias limpas.

6 – Licenciamento ambiental: Procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, observadas as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso para impedir ou mitigar os possíveis danos dela advindos (Resolução CONAMA 237/97).

6 – Escórias de alto-forno: subproduto da produção do aço, feito nas aciarias. É, portanto, resultado da agregação de diversos elementos os quais não interessam que estejam presentes no material aço, sendo utilizadas na produção de cimento e base para pavimentos e agregados de concreto.

7 – Pozolana: Qualquer substância pulverulenta siliciosa, ou siliciosa e aluminosa, que reage quimicamente com cal, para formar um composto com as propriedades do cimento.

Bibliografia

A versatilidade do cimento brasileiro. Disponível em http://www.abcp.org.br/conteudo/basico-sobre-cimento/tipos/a-versatilidade-do-cimento-brasileiro.

Associação Brasileira de Cimento Portland. Fabricação. Disponível em http://www.abcp.org.br/conteudo/basico-sobre-cimento/fabricacao/fabricacao.

CIOCCHI, Luis. Reciclagem de concreto. Disponível emhttp://www.fernandoavilasantos.kit.net/reciclagem_de_concreto.htm.

MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA. Balanço Energético Nacional 2009: Ano base 2008 / Empresa de Pesquisa Energética. Rio de Janeiro: EPE, 2009. 274 p.

PINTO, Tarcísio de Paulo (coordenador). Gestão ambiental de resíduos da construção civil: a experiência do SindusCon-SP. São Paulo: Obra limpa, I4T. SindusCon-SP, 2005.

Reciclagem de sacos de cimento. Disponível em http://www.setorreciclagem.com.br/modules.php?name=News&file=article&sid=751.

SANTI, Auxiliadora Maria M. e SEVÁ FILHO, Arsênio Oswaldo. Combustíveis e riscos ambientais na fabricação de cimento; casos na Região do Calcário ao Norte de Belo Horizonte e possíveis generalizações. II Encontro Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade – Anppas. Campinas, 2004.

VIEIRA Feijó, Bruno e SOUZA, Luís. Revolução na construção: Como é feita a produção do cimento? Quem inventou essa fórmula? Revista Galileu . Disponível em http://revistagalileu.globo.com/Galileu/0,6993,ECT832476-1716,00.html.

VOTORANTIM CIMENTOS. Ambiental. http://www.votoran.com.br/htms-ptb/Responsabilidade/Coprocessamento.htm.

http://www.webartigos.com/articles/9201/1/PALEONTOLOGIA-DEFINICAO-FUNDAMENTACAO-E-OBJETIVOS/pagina1.html+ixzz1RpJoDarS

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